American Fiction

Este "american fiction" marca a estreia na realização de Cord Jefferson. Uma excelente estreia. Embora haja vários subenredos, a temática central desta película é o facto do protagonista "Monk" (Jeffrey Wright em brilhante interpretação) considerar que os livros de e sobre negros devem ser igualmente universais tal como acontece nos "livros de brancos". Ele ("Monk"), escritor a passar por uma fase pouco conseguida a nível da escrita e com dificuldades financeiras, está cansado das temáticas dos livros sobre negros que "vendem" serem sempre as mesmas (poucas oportunidades, delinquência juvenil, polícias que abusam da autoridade perante negros, mães solteiras a ter que criar 5 filhos e assim por diante) e não terem a tal universalidade temática que ele reivindica. Para ele, o "universo dos negros" é muito mais do que a meia dúzia de temas explorados nos tais "livros sobre negros". Então resolve, numa noite de raiva, álcool e irritação, escrever um livro que "dá" aquilo que o público quer e consome, uma das tais histórias "estereotipadas" sobre o "mundo negro". E faz isso usando um pseudónimo para ninguém ficar a saber a sua identidade. Para sua surpresa, o livro torna-se em pouco tempo um sucesso, um "best-seller" e acaba nomeado para melhor livro do ano numa competição em que ele próprio é convidado para ser um dos membros do júri. É um argumento com força e muito inteligente, sem dúvida. A narrativa e desenvolvimento do filme tem algumas irregularidades devido à forma como vão aparecendo outras histórias, como são a relação de Monk com a sua família: o irmão homossexual, a irmã que morre subitamente e a mãe que começa a sofrer de sintomas da doença de de alzheimer. Há ainda a relação amorosa que "MonK" inicia com Coraline (Erika Alexander) e ainda a personagem de Sintara Golden (Issa Rae), escritora que está "na moda" devido a ter escrito um livro com grande sucesso e que também faz parte do tal júri. Estas "pequenas" histórias não tem muito desenvolvimento mas até estão razoavelmente bem conseguidas, com a exceção da relação de "MonK" com Sintara Golden, que merecia outro desenvolvimento. "Monk" acha que Sintara faz parte dos tais escritores típicos que exploram sempre as mesmas temáticas sobre os negros. No entanto, quando a conhece e estabelece alguma relação de diálogo com ela no tal júri repara que ela partilha com ele as mesmas ideias que já referi e fica intrigado com isso. É uma pena que esta "relação" não seja mais aprofundada no filme, pois prometia. É talvez o único ponto em que o filme falha. Para além de tudo isto, o filme apresenta cenas de diálogos bem conseguidas, muitas delas também muito divertidas, com um humor muito satírico e inteligente. O final do filme é ambíguo, já li quem dissesse que o realizador não sabia que fim havia de dar ao filme. Talvez, mas eu até achei o final bem conseguido, a cena "de sonho(?)" em que os polícias entram na cerimónia de entrega do tal prémio de livro do ano (isto porque "Monk", na sua falsa identidade de pseudónimo, afirma ser um foragido da justiça) e massacram "Monk" com tiros é de antologia. Muito boa estreia de Cord Jefferson na realização, com um filme que se revela extremamente inteligente na temática proposta.

Enviado por  António MDFC